por Ana Balderramas
Se tem uma coisa que eu sou boa nessa vida, é reclamar. Não me orgulho, admito. Mas é quase que um dom natural e que foi muito bem trabalhado ao longo de 26 anos. Eu às vezes odeio ser tão reclamona, maaaaaas é meu jeitinho. E hoje eu vim aqui reclamar do verão. Clichê? Sim. Caguei? Claro.
Cara, eu moro no Rio de Janeiro, carinhosamente apelidado de Hell de Janeiro. Se você nunca veio passar férias no verão do Rio, você é garoto! Moleque! Pede pra sair! Lidar com o calor do Rio tendo que trabalhar, ir pra escola, ser feliz, viver, é uma tarefa árdua. 5 da manhã, saindo do banho gelado e eu já começo a suar. Você olha pro céu, implora a Deus que mande pelo menos uma brisinha e nada. Nenhuma folha balançandinha sequer. E bora encarar o ônibus lotado sem ar porque não tenho escolha.
O ônibus no calor é um microcosmo muito particular. São várias figuras conhecidíssimas por todo carioca. A começar pelo motorista. O motô só tem apenas dois estados de espírito – extremamente puto ou extremamente bróder. NÃO EXISTE MEIO TERMO. O Rio é uma cidade de extremos! Tem o grupão que vai para a praia, 100% equipados com cadeiras, guarda-sol e isopor recheado de guloseimas. E as crianças já vão sendo bezuntadinhas de protetor. Tem a tia do paninho: o calor da porra gera uma suadeira incontrolável e a tia do paninho se utiliza da versátil toalhinha. Ela passa o paninho no suvaco, na testa, nos peitos, na cara da Jaqueline, sua filha, na testa de novo. E pra guardar TEM que ser apoiada na brusinha metade pra dentro, metade pra fora. O pessoal que vende guloseimas é uma atração à parte. O discurso sempre ensaiadinho e cada um tenta ser mais original que o outro. E convenhamos que aquela gambiarra de saquinhos pra displayar os produtos é ge-ni-al e prático.
Existe também o fenômeno da síndrome de manada do busão, que funciona assim: se alguém está muito estressado e faz uma grosseria, xinga ou arruma confusão, a coisa se espalha. Aí todo mundo parece que entra num turbilhão de negatividade e é muito triste. Mas o contrário também acontece, pois, como diria o profeta gentileza, gera gentileza. É um tal de “senta aqui, senhora” pra cá, “quer que eu segure sua mochila?” pra lá e fica bonito de ver! E o ônibus lotado aqui é padrão, então a gente acaba se acostumando com o fato de ter que ficar grudadinho na pessoa do lado, junto com a da frente e a do outro lado.
Pera, mas eu estava falando de calor, né? Calor tem dessas coisas, faz a gente perder o foco. Comer no verão também é um problemão pra mim. Eu perco a fome total! Gosto de comida quente, arroz fresquinho e feijão derretendo e pra encarar essas iguarias no calor é dose. Dá vontade de almoçar sorvete todo dia, pena que não pode. Às vezes tá liberado trocar uma refeição por um copão de suco com saladinha, né? Eu pratico.
Enfim, no calor do Rio tudo fica difícil, até pensar pra escrever esse texto. Então vale tudo mesmo: piscina de plástico no quintal de casa ou na varandinha do apê, encher a cara de sacolé de fruta que a vizinha faz, altas gambiarras pra fugir do calorão. E a gente sobrevive até o próximo verão, se tudo der certo. Amém.